A clínica como ponta de lança
- 10 de fevereiro de 2025
Recursos que têm por objetivo assistir pacientes também podem reproduzir violências
Por Yan Chaparro
Muitas vezes a clínica pode cometer uma dupla violência, quando desvia os olhos para as consequências relacionadas às violências no campo racial, sexual, de gênero e de classe. Dupla violência, pois ao invés de encarar de frente as violências, se esconde sorrateiramente em alguma teoria ou diagnóstico, e acaba produzindo uma clínica dissociada, um território cindido do cuidado.
A cada dia que passa, que os pés caminham pela clínica, é possível compreender de corpo inteiro, que os sofrimentos cuidados no campo clínico, tanto nos atendimentos individuais, quanto em grupo, são produzidos historicamente por violências que a pessoa sofre por ser subjugada e subalternizada (os corpos sociais).
Sofrimentos que não são só micros, e sim macros, construídos nas engrenagens da sociedade vivida, sofrimentos que quando encarados no campo micro da clínica, seu cosmo torna-se cosmopolítico, movendo um enfrentamento que envolve o cuidado e o movimento de caminhar e produzir transformações, saídas e revoluções.
Uma clínica que não enfrenta as violências que são micro e macro, cai em um lugar perigoso, do dogmatismo moralista vestido de alguma teoria extraterrestre e fantasiosa, digo extraterrestre, pois não pisa o mesmo chão do sofrimento aberto em sua frente.
Muitas vezes o que é denominado e diagnosticado com nomes fantásticos e outras nomenclaturas, é na verdade o sofrimento encarnado no corpo atingido cotidianamente por violências de diversas formas.
Como uma lança, a clínica necessita cada vez construir poéticas e políticas de revoluções (rebeldias sensíveis), e tecer diversos desejos e concretudes para além de fetiches, clichês e fantasmas. Uma clínica que expande o corpo.