Protagonismo rubro-negro

O ato de surpreender e improvisar sempre existe, e ainda bem que existe – pois seria uma pena se uma equipe tão qualificada como este Flamengo não conseguisse coroar o ótimo trabalho.

Por Alison Silva
Ilustração: Fábio Faria e Norberto Liberator

Ah, como é difícil! Muito difícil falar desta equipe tão qualificada que é o Flamengo. Eu poderia iniciar este texto simplesmente exaltando o trabalho coletivo da equipe ao longo do ano, salientar a semelhança entre os goleadores em ambas as finais rubro-negras na competição – Gabigol neste ano e Zico em 1981 – ou ainda lembrá-los que as duas conquistas flamenguistas da América aconteceram em um 23 de novembro. Mas não! Simplesmente não sei como iniciar; que dirá o torcedor flamenguista que ansiava a glória ao fim do dia – e que esta chegasse sem tanto sofrimento.

O sábado mal tinha começado e os flamenguistas já estavam a postos para aquele que, para muitos, viria a ser o dia mais importante de suas vidas enquanto torcedores – afinal, os aficionados rubro-negros na faixa de até 40 anos de idade jamais haviam atestado conquista tão importante do clube, ou eram muito pequenos para se lembrar. Durante os momentos que antecederam a finalíssima da Libertadores da América em Lima, no Peru, ouvia-se fogos de artifício por toda a cidade de Campo Grande, situada a aproximadamente 3,4 mil quilômetros do palco da grande final.

Além destas manifestações, meios como televisores, rádios, revistas, jornais e redes sociais faziam questão de agendar o conteúdo recebido por torcedores e não-torcedores, durante as semanas que antecederam a partida, como se os mais de 40 milhões de rubro-negros espalhados no Brasil, Peru, ou qualquer lugar que seja,  precisassem ser lembrados da importância desse dia.

Chegada a hora do jogo, tanto a mídia, quanto os torcedores esperavam encontrar em campo o belíssimo futebol apresentado pelo Flamengo durante toda a temporada; principalmente após a chegada do técnico português Jorge Jesus, responsável por projetar em seus comandados parte do futebol que mais encanta o Brasil nos dias de hoje – queira você ou não.

Não foi o que vimos! Durante todo o primeiro tempo, o Flamengo foi pressionado, exceto nos minutos iniciais quando tentou impor, sem sucesso, sua maneira de jogar. E o adversário? Ah, o adversário, de quem até aquele momento pouco se falava, era o argentino River Plate, então detentor do título e quatro vezes campeão do torneio.

O futebol destilado por Gabriel, Bruno Henrique e companhia ao longo da temporada viu-se barrado pela altíssima e forte marcação “millonaria”. O trio meio-campista formado por Enzo Peres, Exequiel Palacios e De La Cruz anulava todas as ações ofensivas do rubro-negro. Para desespero do torcedor flamenguista, logo aos 14 minutos de partida, Borré abriu o placar para os argentinos. Neste momento, o barulho dos torcedores flamenguistas presentes no Estádio Monumental de “U” fora silenciado pelos cantos de nossos hermanos argentinos.

Será que a tão esperada festa flamenguista seria barrada por um River Plate de quem pouco se falava? A imprensa brasileira tratou de promover a ótima equipe do Flamengo, contudo, esqueceu de mencionar o adversário, indigesto – que tentava de maneira muito qualificada bailar o tango argentino em dia de samba.

Ilustração mostra Jorge Jesus, Gabigol e Marcelo Gallardo.

Finalizada a primeira etapa, de muito River e pouco Flamengo, os meios de comunicação buscavam justificar a seus espectadores o feito dos argentinos até o momento, como se estivessem surpresos, como se estes tivessem esquecido de seguir o roteiro que eles dissertaram para a partida.

Na volta da segunda etapa o Flamengo precisava agredir o adversário, fazer algo diferente. William Arão recuou a linha de zaga para auxiliar na saída de bola rubro-negra; enquanto isso, o “script” divulgado pelos comunicadores brasileiros não era seguido pelos jogadores do River, – que pareciam não querer colaborar com o “texto ensaiado” entre os atletas antes da partida.

Aos 30 minutos da etapa complementar, Marcelo Gallardo, técnico do River Plate, tratou de “acertar” as coisas com os seus colegas da imprensa brasileira. Sacou de campo Borré, autor do gol da partida e que vinha bem em campo, para dar lugar a Lucas Pratto. Aos 32, Casco, lateral que apesar de amarelado na partida, desempenhava bem o papel de marcar Bruno Henrique – um dos então protagonistas da final –, deu lugar ao zagueiro Paulo Díaz. As alterações surtiram efeito, pena (para o River) que contrário ao desejado pelo técnico argentino.

Após as mudanças, o aguardado Flamengo deu as caras. Nesse momento a equipe era só ataque. O River Plate se retraiu em campo na tentativa de projetar uma contraofensiva que pudesse dar números finais ao jogo, sem êxito.

Diego, que havia entrado no lugar do lesionado Gérson, ditava as ações ofensivas do rubro-negro. Aos 44 da segunda etapa – momento em que os roteiristas já ensaiavam suas desculpas pelo insucesso da obra – “o mocinho”, até então apagado na trama, apareceu de forma decidida e contundente. Após erro de passe de Lucas Pratto no início da jogada, Gabigol finalizou livre para empatar a partida. Dois minutos mais tarde, em falha defensiva, novamente protagonizou um belo chute na saída de Armani para dar números finais à decisão.

Após os dois gols, Gabriel saiu de cena ovacionado pela nação rubro-negra, mesmo após receber o segundo amarelo na partida já em lance dos instantes finais de jogo, sendo o primeiro cartão por retirar a camisa durante a comemoração do segundo gol. Pouco importava para os mais de 25 mil flamenguistas presentes, que apenas se preocupavam em comemorar um título que há 38 anos o clube não conquistava.   

Fim de jogo. Flamengo 2×1 River Plate, festa rubro-negra. Gabriel tratou de seguir à risca o roteiro possível para a imprensa brasileira. “Ah, mas o clube não mereceu a vitória”? Mereceu e muito! Porém, há dias em que até os mais qualificados “atores” não contracenam bem. Contudo, o ato de surpreender e improvisar sempre existe, e ainda bem que existe – pois seria uma pena se uma equipe tão qualificada como este Flamengo de 2019 não conseguisse coroar o ótimo trabalho no ano. 

Que venha o mundial, que venha o Liverpool – espera, esse roteiro eu já vi…

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