Donald Trump e o Atlântico Norte
- 2 de dezembro de 2024
Eleição de ex-presidente para novo mandato pode redefinir geopolítica global
Vitor Roggero
O embate entre republicanos e democratas trouxe, mais uma vez, uma nova rota aos rumos dos ianques. Donald Trump, bilionário americano que foi presidente entre 2017 e 2021, venceu em novembro as eleições que o reconduzem ao comando da maior potência imperialista do mundo, a partir de janeiro de 2025.
Embora seja certo que o debate político estadunidense nunca trate de questões fundamentais, ao menos no que tange a estrutura social, há, de fato, uma diferença entre tais tendências – ainda liberais – em vários assuntos, sendo, talvez o mais relevante, a geopolítica. Aqui, vale uma análise mais precisa sobre a política externa dos democratas e dos republicanos, sobretudo no contexto da globalização econômica e da ordem unipolar.
No que tange à Ucrânia, tudo aponta para o fato de que os principais derrotados dessa corrida eleitoral são Zelensky e seus aliados nazistas. Um breve estudo sobre o caso ucraniano demonstra uma evidente diferença de gestões em relação ao conflito na região: o auge da guerra civil ocorreu a mando e financiamento da gestão Obama, quando não só o império armou os nazistas do Pravy Sektor cuja revolução colorida viria a depor Yanukovytch em favor de Poroshenko, como armou os nazistas do Azov e outros batalhões igualmente neofascistas que viriam a impor o braço armado da ditadura que perseguiria russos étnicos pelo Donbass, desrespeitando inclusive tentativas de cessar-fogo celebradas pelos Acordos de Minsk. Na gestão Trump, contudo, a questão ucraniana foi, de certa forma, “congelada”, não trazendo novos capítulos até que, em 2022, já na gestão Biden – marcando o retorno dos democratas –, o exército de Kiev novamente atacou a fronteira do Donbass, colocando a região das repúblicas de Donetsk e Lugansk em estado de alerta máximo, o que finalmente forçou a Rússia a reconhecer as repúblicas e a dar início a sua operação militar.
Contudo, é necessário notar que, apesar da notória importância da questão ucraniana para a geopolítica atual, seria leviano, a partir de tal leitura, presumir que Trump e os republicanos seriam menos belicistas; afinal, há de se lembrar as constantes provocações de tal gestão contra a Coreia do Norte, os ataques à Síria em 2017, a tentativa de golpe de Estado na Venezuela em 2018, o assassinato do General Soleimani em 2020 e a estrondosa campanha de sinofobia agravada na pandemia, entre 2020 e 2021.
Tendo-se em vista, aqui, que ambos os programas representam alternativas dentro de um modelo fechado de consenso liberal-imperialista, há de se atentar às suas diferenças. Em termos de geopolítica, o jogo global tem por meio-termo – e, logicamente, um ator fundamental na disputa – a União Europeia. Aqui, é mister falar em atlantismo em stricto sensu, ou seja, no sentido das potências do mar Atlântico.
No projeto republicano, em primeiro lugar, identifica-se uma premissa de disputar a geopolítica a partir de uma abordagem principalmente empresarial – logicamente, a serviço da sua fatia da burguesia ianque – e, em um contexto de globalização econômica, a luta contra a multipolaridade ou qualquer outro movimento de contra-hegemonia se dá com a guerra comercial com a China, sendo, portanto, Pequim o “grande inimigo”. Não obstante, por tal premissa empresarial, é normal que os interesses supostamente neutros da União Europeia de universalização dos direitos humanos e de uma perspectiva de progressismo pós-liberal não são mais relevantes, a exemplo de sua política protecionista anti-imigração e da saída dos Estados Unidos do Acordo de Paris.
O projeto democrata, porém, traz uma outra linguagem que, talvez, possa ser lida como mais complexa. Pepe Escobar, palestrando em evento do Brasil 247, afirmou que a guerra da Ucrânia é uma guerra contra três atores, sendo o primeiro e mais óbvio a Rússia, o segundo a China – um conflito na região do Mar Vermelho atrapalharia os planos do Partido Comunista de construção da Nova Rota da Seda – e o terceiro, a Europa.
A guerra ao velho continente é, possivelmente, o fator mais interessante: embora, em um primeiro momento, os democratas demonstrem um alinhamento ideológico quase perfeito com a esquerda liberal europeia, economicamente, o interesse estadunidense – aqui, democrata – é, ainda, de submissão, inclusive das democracias liberais europeias ao dólar. Por óbvio, problemas da Alemanha com a falta de gás são um problema para a sobrevivência da economia e do bem-estar social, enquanto, por outro lado, podem ser uma fonte de ganhos para algumas carteiras em Wall Street.
Assim, tal mudança de um foco ação contra a China para uma compreensão da Rússia como o “grande inimigo” é, ainda, empresarial e propriamente burguesa, mas, certamente, é um outro caminho que os imperialistas podem traçar contra a multipolaridade em defesa da hegemonia do dólar, sendo assim a defesa da ordem unipolar do capital financeiro ocidental. Com o resultado de eleição estadunidense, propõe-se um cenário de “tirar o pé do acelerador” contra a Rússia – e, inclusive, de possivelmente “cobrar a conta da guerra” a Zelensky – e de retorno à incessante disputa comercial contra o dragão comunista chinês; agora, é apenas uma questão de tempo até vermos as próximas cartadas que Trump e seus republicanos darão nas próximas jogadas.
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