Como funciona o sistema político iraniano?

O protesto de uma jovem iraniana contra o rígido código de vestimentas do país repercutiu em todo o mundo; entenda como funciona o complexo sistema político iraniano e a disputa interna entre os grupos locais

Por Norberto Liberator
As imagens de uma jovem caminhando apenas com roupas íntimas, na Universidade Azad, no Irã, viralizaram internacionalmente. De acordo com a agência Fars, a estudante foi reprimida pela milícia Basij por “se vestir de forma inadequada”, e tirou toda a roupa em protesto ao rígido código de vestimenta iranino. É o primeiro grande desafio do presidente Masoud Pezeshkian na questão de costumes. O reformista foi eleito com promessas de flexibilizar a legislação no tema.
O Irã possui um sistema político único no mundo, que mescla elementos de república representativa ao poder quase absoluto de líderes religiosos. Apesar de ter um presidente eleito, suas decisões podem ser revogadas pelo líder supremo, necessariamente um aiatolá (mais alto cargo religioso no Islã xiita).
Desde a Revolução Islâmica de 1979, que instituiu o atual sistema, o Irã teve dois líderes supremos. Aiatolá Ruhollah Khomeini (1979-1989) – Aiatolá Ali Khamenei (1989-)
O presidente da República é quem governa, eleito por sufrágio universal* para cargos de quatro anos com possibilidade de reeleição. O Parlamento conta com 290 membros, também eleitos pela população. Há cotas parlamentares para três minorias étnico-religiosas: judeus, assírios e zoroastristas. As leis aprovadas pelo Parlamento passam pelo Conselho dos Guardiões, formado por 12 clérigos. *Homens e mulheres adultos de cidadania iraniana têm direito a voto
Masoud Pezeshkian foi eleito após a morte do então presidente conservador Ibrahim Raisi, e faz parte da corrente reformista. Ele prometeu, em campanha, que mulheres não seriam reprimidas por não usar o hijab (véu). O único presidente reformista até então havia sido Mohammad Khatami, que governou de 1997 a 2005. Membro da chamada “Esquerda Islâmica”, seu governo foi conhecido como “Era das Reformas”.
A política iraniana é formada por três correntes principais: Os principialistas, mais conservadores; Os reformistas, também conhecidos como reformistas radicais; E os pragmatistas, também conhecidos como moderados ou reformistas pragmáticos. Os três grupos já elegeram presidentes da República: Abolhassan Bani-Sadr (1980-1981) – Pragmatista Mohammad-Ali Rajai (1981) – Principialista Ali Khamenei (1981-1989) – Principialista Akbar Rafsanjani (1989-1997) – Pragmatista Mohammad Khatami (1997-2005) – Reformista Mahmoud Ahmadinejad (2005-2013) – Principialista Hassan Rouhani (2013-2021) – Pragmatista Ebrahim Raisi (2021-2024) – Principialista Masoud Pezeshkian (2024-) – Reformista
Durante o mandato do principialista Ebrahim Raisi, as mortes de duas jovens desencadearam intensos protestos e geraram pressões internacionais contra o Irã. Em setembro de 2022, Mahsa Amini, de 22 anos, foi assassinada por um golpe violento na cabeça, pela Polícia da Moral, por usar o véu sem cobrir totalmente os cabelos. Em outubro de 2023, a adolescente Armita Garawand, de 16 anos, morreu após complicações devido às agressões que recebeu. A família e testemunhas dizem que a Polícia da Moral a violentou por não usar o véu, mas o governo negou.
Mais conciliador em relação ao Ocidente, Pezeshkian sabe que o Irã não precisa de polêmicas por violações dos direitos humanos. O país tem escalado sua tensão com Israel e sido uma das principais vozes mundiais contra o genocídio em Gaza. Um dos grandes desafios do presidente é manter sua credibilidade internacional enquanto tenta avançar reformas humanitárias em seu país.

Norberto Liberator

Jornalista, ilustrador e quadrinista. Interessado em política, meio ambiente, artes e esportes.

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