Cuiabá: Lúdio Cabral e as rodas da cidadania

Candidato petista pode fazer história como primeiro prefeito pelo partido na capital mato-grossense

Por Gibran Lachowski
Arte: Norberto Liberator

Domingo, 27, pode ser um dia histórico para o PT e a esquerda em Cuiabá, com a possibilidade real de vitória do primeiro petista à Prefeitura da capital mato-grossense, o médico sanitarista Lúdio Cabral.

 

É o que se tem visto nas duas semanas subsequentes ao final do primeiro turno, quando Lúdio passou à próxima etapa da disputa superando o deputado presidente da Assembleia Legislativa de Mato Grosso Eduardo Botelho, candidato do governador Mauro Mendes – ambos do União.

 

Botelho, cuja maioria dos institutos de pesquisa apontava com larga vantagem sobre os demais concorrentes e que há anos vem fazendo campanha pelo Palácio Alencastro, foi o fiasco do pleito municipal, puxando para baixo Mauro Mendes, até então alguém que pairava sobre a política estadual e, hoje, tido como o maior derrotado do primeiro turno na capital.

 

Mas o cenário é complexo e teve como primeiro colocado no domingo, 6, o arquiteto Abílio Brunini, deputado federal pelo PL e conhecido fanfarrão da política no pior estilo da extrema direita – preconceituoso, falastrão e metido a lacrador. As pesquisas que apontavam Abílio e Lúdio no segundo turno hoje dão os dois praticamente empatados, com tendência constante de subida do petista, que terminou a etapa inicial com 11% atrás (39,6% a 28,3%).

 

O derretimento da campanha do candidato da extrema direita pode ser mais bem explicado pela capacidade de trabalho e articulação da campanha do candidato Lúdio Cabral. Investindo numa estratégia eleitoral que diminui a incidência do PT ao mesmo tempo em que valoriza a proximidade do petista com o Governo Federal, Lúdio tem preenchido uma agenda política com vários ministros, incluindo o vice-presidente e ministro da Indústria Geraldo Alckmin (PSB).

 

Em contrapartida, seu principal cabo eleitoral no governo federal é o ministro da Agricultura e senador licenciado Carlos Fávaro, umas das lideranças do PSD, partido que mais se consolidou nas eleições municipais de 2024 conforme os resultados do primeiro turno, e, ainda, a aposta (pouco difundida) de Lula para disputar o governo de Mato Grosso em 2026. Fávaro, que projetou-se como liderança do agronegócio e já foi bastante próximo de Mauro Mendes, tende a ser um elemento de disputa e confusão no meio do “empresariado da soja”.  

 

Na propaganda eleitoral, Lúdio fala como prefeito, mencionando o perfil do futuro secretariado, que deve ter “qualificação técnica”, “capacidade de diálogo com os diferentes” e “sensibilidade humana”, enquanto seu opositor insiste na ideia de que “Cuiabá nunca será do PT”.

 

O jogo que se joga na atual campanha em Cuiabá é um jogo pragmático, complexo, repleto de paixões. Desenha a próxima disputa ao governo do estado, provavelmente com Fávaro como candidato de Lula/PT/Governo Federal e Otaviano Pivetta (Republicanos), o vice de Mauro Mendes, postulante do grupo ocupante do Palácio Paiaguás. Leva o PT a um exercício muito delicado, de se mostrar menos à população, sob o slogan do “governar para todos”, podendo diminuir o estigma sobre o partido, porém correndo o risco de perder o simbolismo aguerrido que permeia ainda o imaginário de parcela da sociedade.

 

Talvez a capacidade de Lúdio de dialogar com os mais variados grupos populares seja a sua principal ferramenta de luta – e promoção de condições para viabilizar a melhoria de vida da população cuiabana. E nessa prática constante de articulação popular, um tipo de ação talvez ajude seu governo a ter uma singularidade amplamente reconhecida: o exercício de fazer rodas de discussão em torno de questões prementes, as chamadas “rodas da cidadania”.

 

Lúdio é o único político petista em Mato Grosso com mandato e projeção, que hoje implementa com afinco essa prática pautada na disposição das pessoas em círculo e no espaço aberto de fala, mesmo que depois o volume de apontamentos precise de um trabalho de síntese e encaminhamento mais executivo.

 

Imaginar que isso possa ser uma forma de governar uma cidade é animador, contudo é também um enorme desafio diante do engessamento e da burocratização que sustenta a institucionalidade da máquina pública neste Centro-Oeste ainda muito iludido com as invenções do Ocidente estadunidense, francês, inglês e alemão.

 

A campanha de Lúdio tem acentuado suas lutas sociais nos mandatos parlamentares que ocupa desde 2004, duas vezes como vereador e, agora, no segundo mandato de deputado estadual. 

 

As atuações do petista são fruto de trabalho de escuta e conversas com a base, em diversas áreas como: transporte coletivo; juventude; saúde pública; gestão democrática nas escolas; defesa dos pescadores; defesa dos direitos dos servidores públicos; crítica ao modelo socioeconômico e ambiental centrado no agronegócio de exportação; e proposta de um modelo de sociedade pautado nos saberes populares dos diversos grupos marginalizados que indicam uma perspectiva mais holística, sistêmica e sustentável de vida..

 

Essa história de roda da cidadania é um exemplo de como o Sul Global pode se estabelecer gradativamente no terreno da política de Estado a partir de uma prática política de caráter coletivo-popular. No entanto, antes, é preciso ganhar a eleição.

Gibran Luis Lachowski

Jornalista, professor universitário em Mato Grosso e doutor em Estudos de Cultura Contemporânea

Norberto Liberator

Jornalista, ilustrador e quadrinista. Interessado em política, meio ambiente, artes e esportes.

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